A capacidade de saber esperar (#045)

Por Fabiana Vitorino

"Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede um pouco mais de alma
A vida não para
Enquanto o tempo acelera e pede pressa
Eu me recuso faço hora vou na valsa
A vida tão rara

Enquanto todo mundo espera a cura do mal
E a loucura finge que isso tudo é normal
Eu finjo ter paciência
E o mundo vai girando cada vez mais veloz
A gente espera do mundo e o mundo espera de nós
Um pouco mais de paciência

Será que é o tempo que lhe falta pra perceber
Será que temos esse tempo pra perder
E quem quer saber
A vida é tão rara, tão rara

Mesmo quando tudo pede um pouco mais de calma
Até quando o corpo pede um pouco mais de alma
Eu sei, a vida não para
A vida não para não."
 

Paciência. Uma grande canção do Lenine, que sempre me provocou muitos sentimentos ao ouvi-la. Eu fiquei com muita vontade de continuar essa conversa sobre o tempo, sobre as prioridades, sobre os papéis que exercemos na vida, começando com essa música do Lenine.

Para quem está chegando agora, eu sou a Fabiana, sou psicóloga, sou consultora de carreira, palestrante, escritora, já fui muitas outras coisas e tenho feito esse podcast com muito carinho, um momento de troca, de conexão com você que para pra me ouvir sempre que eu envio conteúdo novo.

Para quem já me conhece, vem acompanhando esse material, são várias conversas, vários temas, várias trocas feitas por aqui. Eu comecei uma conversa sobre tempo, sobre organização do tempo e por aí vai. E hoje fiquei muito tocada em pensar justamente nessa etapa que a gente precisa construir na nossa vida, que é a etapa da calma, a etapa da espera, de quando as coisas demoram um pouco mais para acontecer, e o quanto nós precisamos ter paciência para esse tempo das coisas, que não é o tempo que eu defino, que eu decido, mas é o tempo que a vida decide por nós.

Eu fico pensando muito no equilíbrio entre o que o nosso corpo pede e o que a nossa alma necessita. Às vezes o corpo é da parte física, concreta, material, da urgência, ele tem a necessidade do alimento, ele tem a necessidade da troca, do afeto, do toque, do banho, de uma série de coisas; às vezes o tempo vem um pouquinho mais acelerado para que a gente faça algumas coisas do corpo, mas não necessariamente.

Mas a alma sempre tem um tempo mais desacelerado, um tempo mais calmo, um tempo de espera, e na verdade ambos são importantes e precisam ser cuidados. É importante que a gente cuide das necessidades do corpo, talvez com uma atividade física, com uma boa alimentação, com o sono, e por aí vai… Mas a alma pede outras coisas como necessidade básica.

Eu me lembrei também de uma história que eu escutei lá na minha formação em Constelação Familiar Sistêmica, e foi uma história que me tocou muito. Na verdade essa história depois veio em outros momentos da minha vida, que é quando, na questão do progresso, da transformação das estradas e das ferrovias do homem branco, diz a história que um índio foi convidado, o índio de uma determinada tribo foi convidado a participar de uma viagem de trem, para que ele pudesse ver o progresso que estava acontecendo ali nas terras próximas à dele.

Os homens todos entraram dentro daquele trem e ele entrou junto, e aquele trem foi disparado, acelerado, como é o movimento de um trem. E parou numa determinada estação, todos desceram e aquele índio desceu. Ele olhava em volta e não conseguia ficar totalmente bem naquele momento, e de repente ele se sentou nos trilhos, depois que o trem foi embora, e ele ficou ali por alguns instantes respirando e concentrado. Um dos homens que estavam junto naquela visita perguntou para ele o que estava fazendo ali. Por que ele estava parado no meio do trilho?

E ele respondeu assim: "Estou esperando a minha alma chegar. Esse trem veio tão rápido, que ela não teve tempo de chegar junto com o meu corpo, então o meu corpo está aqui, mas a minha alma ainda não chegou, então agora estou esperando para que ela chegue, para que juntos – alma e corpo – possamos dar seguimento ao que a gente veio fazer".

Eu fico pensando nessa história, nessa metáfora de quando, na nossa vida, o nosso corpo chega na frente e a nossa alma ainda não chegou, porque foi muito rápido, foi acelerado. Às vezes a gente precisa dar um tempo de pausa, de calma, de espera. Em um mundo tão agitado, onde tudo tem que ser tão rápido, tão fast food, será que a nossa alma tem conseguido nos acompanhar quando a gente vai para o trabalho, quando a gente vai para os relacionamentos, quando a gente vai para um lazer, quando estamos efetivamente esperando que algo aconteça na nossa vida, o resultado de algo.

Qual é o nosso tempo de espera? Qual é a nossa capacidade de saber esperar? Não estou dizendo que tem um tempo que é certo e que o que é bom para mim pode ser bom pra todos. Na verdade, o grande desafio que eu vou lançar para você é: você precisa perceber qual é o seu tempo necessário de espera, nas coisas que você precisa movimentar na sua vida. Porque cada pessoa tem um ritmo, cada pessoa tem uma forma de organizar a si mesmo, de organizar o dentro e organizar o fora. Mas geralmente um bom sinal é quando você se sente conectado, quando parece que está tudo unido naquele exato momento: sua mente, seu coração, sua alma, seu corpo, estão sincronizados.

Quando a gente sente um desassossego, quando o corpo adoece ou quando tem uma preocupação muito grande na mente, ou quando gera uma ansiedade muito grande numa determinada situação, pode ser que uma das partes não estejam sincronizadas, e aí a gente precisa dar uma parada, uma respirada, uma meditada, quem sabe, para conseguir alinhar o ritmo que a alma precisa com o ritmo que o corpo pede também, entendendo que ambos têm a sua grande importância.

Fica o convite para que você possa prestar atenção em como tem sido a construção da sua vida, o quanto você tem dado tempo para as coisas se movimentarem no fluxo natural que elas vão movimentar, fazendo obviamente a sua parte, tendo as suas ações concretas e assertivas, mas sabendo que tem um tempo de espera. E que a vida é isso. 

Eu sempre gosto de pensar, por exemplo, meu marido é agrônomo –para quem não sabe, agrônomo e paisagista –, então ele trabalha diretamente com o tempo das coisas, ele planta uma planta, ele tem que mexer na terra, revolver, montar toda uma estrutura de paisagismo, mas ele sabe, por ser também agrônomo, que as plantas têm um tempo de crescimento, de desenvolvimento, de maturação, que uma semente tem um tempo para brotar, para crescer, para florescer, e a gente precisa respeitar esse ritmo.

Quando você não respeita, quando você já quer que a semente vira flor, vira fruto de uma hora pra outra, o quanto isso gera ansiedade, o quanto isso gera sofrimento. E não adianta, não vai mudar porque você quer, as coisas vão ser no ritmo que precisam ser. Nós é que precisamos aprender a nos conectar a esse ritmo maior que se chama vida.

Espero que essa reflexão possa caber no seu dia, fazer sentido na sua semana. Fico aqui para bater um papo sobre isso que movimenta aí com você. Espero que você fique bem, aproveite o conteúdo, compartilhe com quem desejar.

Um grande abraço. Tenha uma boa semana. Tchau, tchau.

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