O que me impede de fazer uma pausa, sem culpa?

No início do ano, Bianca começou ir à escola, e eu que vinha de uma dedicação exclusiva me vi pela primeira vez, em quase três anos, tendo em todas as tardes um tempo em que eu poderia trabalhar, resolver pendências, encontrar amigas, cuidar de mim. Uau!! Que sonho!

Comecei querendo fazer mil coisas e me vi num misto de vontade de sair, encontrar todo mundo, atender os meus clientes, bater perna no shopping, ir para o clube, ao mesmo tempo em que só queria mesmo era ficar em casa, descansar, dormir mesmo, sem ser interrompida por um choro ou um: "mamãe, acorda; já é dia", às seis da manhã.

Passada a adaptação das primeiras semanas, comecei a me dar o direito de desfrutar do tempo livre que eu tanto desejava e, mais ainda, que eu precisava.

Mas o que aconteceu foi que cada vez que eu definia uma tarde livre, fosse para não fazer nada ou para fazer o que me desse vontade, eu simplesmente enchia as horas com compromissos, tarefas e coisas inadiáveis. Era como se dentro de mim tivesse uma vozinha dizendo: "Como assim, ter tempo livre?", "Quem é você para isso, enquanto o mundo (ou o seu marido) trabalha? Tanta coisa acontecendo no planeta e você querendo descansar? Quanta pretensão!”

Passei meses travando essa luta diária entre me sentir cansada e desejar o descanso sem culpa e o permitir ou proibir uma pausa, num movimento que aconteceu todo dentro da minha cabeça. Ninguém me disse: "Você não pode", "está errada", mas eu sentia que não era merecedora.

Toda essa história para contar que tenho visto situações como a minha aos montes; mães exaustas que não se permitem o descanso, por não terem o apoio necessário para isso, ou por não se darem o direito. Ou ainda pelo medo (irracional) de não se sentirem produtivas. Oi? Estou falando de mulheres 100% produtivas, cheias de afazeres e compromissos, com um senso de importância muito voltado para o que elas fazem e não para quem elas são. Alguém aí se identifica? 

E eu falo de mães, porque é o que eu vivo de mais intenso nesse momento, mas poderia ser qualquer outra pessoa, com qualquer outro perfil ou papel social. Falo para todos aqueles que vivem nessa loucura de produtividade, dos que se descolam de si para valorizarem os comandos exteriores, que grande parte das vezes nem sequer existem. 

Sim. Precisamos ficar atentos, nos sentirmos bem com o que somos, fazermos nossas escolhas com equilíbrio e respeito às demandas de nossas vidas, inclusive as interiores; entender que somos diferentes e que o jogo da comparação nos causa mais mal estar do que libertação. Não é sobre competir para ver quem produz mais, é sobre criar e viver uma vida mais coerente com nossas necessidades e possibilidades, sobre poder dar pausas e também criar movimento. É sobre poder nos respeitar e ver valor mesmo nas horas em que não entregamos ‘nada’ para o mundo, quando nos realinhamos conosco mesmos e interagimos com mais harmonia e equilíbrio com o mundo.Pode não ser fácil ou simples se permitir essa pausa, por isso, aprender a dar os primeiros passos é essencial. Vamos juntos? 

Fabiana Vitorino

*Psicóloga, mãe, consteladora familiar sistêmica e mentora de carreira.

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