O “novo normal”, com mais empatia e solidariedade

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A ciência a serviço das provas, das certezas, muito nos ajudou e ainda “tenta” nos ajudar. Porém, diante do “invisível”, do “imponderável”, o planeta para e nos coloca a refletir: Quem somos, onde estamos e qual é a nossa finalidade?

Somos corpo, mente e alma. E dentro dessa visão, onde nos colocamos no mundo? E o que fazemos por nós, pelo outro e pelo planeta? 

“Os termos espírito e alma escapam das categorias da razão. Para o filósofo judeu Abraham Joshua Heschel (1907-1972), o homem moderno tende a ver o mundo de forma desencantada, sem a capacidade para perceber o sublime, o misterioso e o maravilhoso. O sagrado é coisificado, tanto quanto o homem e, assim, ambos são esvaziados do seu sentido. E esse método de apreensão do mundo e do ser humano acabou acarretando uma obscuridade no conhecimento do ser humano. Crescemos muito em conhecimento tecnológico, mas muito pouco sabemos sobre quem somos ou quem podemos ser.”1

A atual condição em que vivemos hoje nos faz pensar que o “novo normal” nos traz a possibilidade de retomarmos aquilo que deveríamos ter sido sempre: humanos, “voláteis”, caridosos, empáticos e solidários, com a capacidade de percepção da igualdade, apesar das diferenças étnicas, culturais, econômicas e de identificação sexual. 

Há hoje intensa discussão sobre o quanto, em busca da ciência, nos afastamos do existencial, do espiritual, aqui falando do ser espiritual que somos, da Inteligência Espiritual que verdadeiramente nos define. 

 “Nele, eu aprendi que o essencial é invisível, e que nós devemos viver com os pés no chão, mas com o olhar para o infinito”, conceitua o psiquiatra e antropólogo Adalberto Barreto, que nasceu no Sertão Nordestino e desde cedo conviveu com o sagrado: São Francisco, o protetor o médico, o amigo da família que a todos acolhia. Professor universitário,  sempre teve fascinação por todas as histórias que ouvia, onde a invocação da fé e a fidelidade aos valores religiosos salvavam a todos.

Quem somos, o que pensamos, sentimos e o que vemos nos é fornecido pelas nossas crenças que são formadas ao longo da primeira e segunda infância, adolescência, enfim, durante o tempo em que estamos nos desenvolvendo para sermos adultos e buscarmos o nosso “destino”, o nosso futuro. Dentro desse panorama, a nossa formação acadêmica e profissional, e por que não dizer também a capacitação dos relacionamentos interpessoais, em todos e quaisquer âmbitos da nossa vida. Elas definem nossos pensamentos, sentimentos e nossas escolhas. E dentro do enfoque psicológico, numa abordagem centrada na pessoa, humanista, sistêmica, o nosso todo define nosso lugar no mundo.

Ficar ou partir de um relacionamento, de um trabalho, de um projeto ou da própria vida é sempre uma questão de escolha e, nesse momento, nossas crenças atuam. As crenças limitantes acabam nos impulsionando para as piores escolhas, por não nos julgarmos capazes de vencer desafios que entendemos ser maiores do que nós. Elas nos impedem de fluir na vida. De termos criatividade, fazendo-nos enxergar a nós e ao outro de forma “mesquinha” e “defeituosa”.

Porém, o processo da vida e a possibilidade da transcendência nos confrontam, neste momento em que vivemos, para repensarmos nossos caminhos. 

Também podemos escolher a forma de fazermos o processo da transcendência. Através dela é que chegamos até a nossa alma. Compreendemos nossa missão e olhamos para o outro, entendendo que ele também é um ser que merece respeito, ajuda e amor. Que precisamos caminhar juntos.

Então faz parte da nossa caminhada evolutiva, além do autoconhecimento psicológico, a nossa prática espiritual. Aqui falando da prática que nos leva a entrar em contato com o divino: Deus; cada ser da forma como o sente, percebe e crê.

Na crise, temos os melhores insights, as melhores ideias, talvez porque nos desprendamos dos resultados conhecidos e do controle. Assim, a crise pode nos libertar. E também nos levar a entrar em contato com o divino, muito especialmente a crise atual, no mundo, nunca vivida antes.

Se a pandemia trouxe sofrimento, infelicidade, mortes e as dores  — e assim relatam os sobreviventes do Coronavírus, os parentes e amigos dos que partiram — ela também trouxe novas experiências, no âmbito dos relacionamentos, dos afetos, do trabalho e da economia.

Nós, os profissionais da “palavra” – os psicólogos – temos ouvido e assistido através de nossos pacientes o quanto se têm descoberto sobre o novo modelo de trabalho: o remoto. E por conta dele, novos aspectos sobre o convívio com parceiros e filhos e sobre a participação nos cuidados com a família e na organização doméstica.

E as incertezas, todas, de todos os tipos e valores? Estas trazem as doenças no âmbito da saúde mental: depressão, ansiedade, crise de pânico e até suicídio, que são as que mais estão em evidência.

Mas, flexibilidade e improviso estão levando aqueles que transitam nestes comportamentos – buscando suas crenças funcionais —  a descobrirem seu propósito de vida e o seu significado para sua comunidade, sua cidade, seu país e para o nosso planeta. 

Nada faltará, enquanto dentro do ser houver pensamentos positivos, tiver farta colheita de transcendência, de práticas meditativas, de pensamentos e sentimentos de prosperidade, de aceitação e desapego, de aceitação do humano e de permissão para seguir em frente.

Enquanto seu propósito de vida incluir o outro, nada faltará a ninguém e o mundo começará a ser como deveria ter sido, SEMPRE.

1- Cf. Heschel, 2006.

Sonia Maria Pinheiro do Prado  

Psicóloga clínica, terapeuta cognitivo comportamental, terapeuta comunitária, supervisora e diretora da Abrape – Associação Brasileira de Psicólogos Espíritas.

 


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